Da radicalidade no teatro de Pasolini
Subirá hoje ao palco da Culturgest a última de 3 representações de «Besta de Estilo», a peça autobiográfica de Pier Paolo Pasolini, por ocasião dos 30 anos do seu assassinato. Vale a pena ir ver, o trabalho do grupo de Antonio Latella é fabuloso e está ao nível da profundidade do texto.
A peça revela e vela pelo autor, misturando visão do mundo e premonição do seu próprio fim. Desfiando a sua vida, Pasolini avalia o trágico século XX, partindo do sonho inicial das vanguardas estéticas, para cair no fascismo e nazismo, renascer com a utopia comunista e desiludir-se com a invasão soviética de Praga de 1968. As suas vida e obra foram, pois, indissociáveis deste aluvião de esperanças, sacrifícios, desilusões e devastações. A sua vida acabou como o século, em balanço trágico e incómodo.
São muito estimulantes as referências de Pasolini a uma série de cientistas sociais, além dos pintores e escritores, todos eles inspiradores da sua reflexão e capacidade de interpelação artística e social.
Dimensão central é a sua invocação singular das tradições campesinas da sua província natal, presentes na peça em forma de lendas, cantos, falar em dialecto, ensinamentos. Daí chegamos ao que há de mais deslumbrante em Pasolini: a capacidade de articular o ancestral e o actual, as continuidades e as rupturas, sempre buscando a radicalidade maior em ambos, e envolvendo-os na vida e na arte. Como diz Stefano Casi, "Besta de Estilo é, na realidade, uma tragédia sobre a tragédia de ser escritor (poeta, intelectual) na sociedade actual".
É um teatro alternativo, nem convencional nem experimentalista, que assim irrompe:
O Teatro da Palavra é um teatro completamente novo porque se dirige a um novo tipo de público. O teatro da Palavra não tem nenhum interesse espectacular, mundano, etc... o seu único interesse é cultural, comum ao autor, aos actores e aos espectadores, que portanto, quando se reúnem, cumprem um Rito Cultural" (Pasolini, «Manifesto por um novo teatro», 1968).
Nb: a peça tem tradução simultânea, em quadro electrónico por cima dos actores.
2 Comments:
Já agora, recomendo o texto, publicado na colecção Livrinhos de Teatro, edição conjunta Artistas Unidos, Culturgest e Livros Cotovia. É um texto para se ler em voz alta, fazendo ressoar as palavras - cada Palavra - de Pasolini. Como uma missa laica, de cultura inconformista.
Super color scheme, I like it! Keep up the good work. Thanks for sharing this wonderful site with us.
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