Anatomia da crítica-entretenimento, ou a crítica na era das audiências
Aproveitar as polémicas para aprofundar questões sérias é tb. o lema de Carlos Leone, que acaba de publicar no Esplanar 2 excelentes textos (I e II) sobre o papel da crítica na era do entretenimento, focando a distinção entre crítica e moda e historiando o papel da crítica.
A lógica do entretenimento e da moda, a pressão dos anunciantes e o facilitismo dificultam a existência, na imprensa lusa, duma crítica mais solta e plural, exterior às próprias redacções. Seja como for, a questão aqui é outra: será que os responsáveis desses jornais estarão mesmo interessados nesse tipo de crítica desconectada da lógica do entertenimento? Quererão mesmo trabalhar a construção de públicos, o diálogo e o encontro com leitores interessados e exigentes?
A ocasião é bem aproveitada por Leone para dar novo exemplo de como os directores de diários nativos têm como desporto predilecto 'filtrar' pessoalmente os textos de opinião dos leitores, não vão passar argumentos incómodos (i.e., preocupados com a verdade dos factos...).
Também eu tive uma experiência similar quanto a um texto de opinião sobre a descaracterização identitária na Fundação Gulbenkian (a articulação entre uma fundação de serviços e de subsídios estava e está sendo desfeita pela fixação no 2.º vector), a propósito da extinção do Ballet Gulbenkian, no Verão passado. Em todos os jornais que contactei a decisão subia ao director (sendo que uns estavam desinteressados, outros em banhos), excepto no DN, e foi aí que saiu (lamentavelmente, os textos dos leitores não constam do site do DN). Ironias da História... A César o que é de César.
Estes directores são os mesmos que batem no peito a propósito de discricionaridades e intromissões do poder político, da censura do antigamente, etc.. É engraçado, não acham?
Nb: Leone é autor de Portugal extemporâneo: história das ideias do discurso crítico moderno (séculos XVI-XX), INCM, 2006, 2 vols. (um prévio resumo pode ser lido aqui).
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