quarta-feira, novembro 30, 2005
A cena dos setecentos sindicalistas que apoiam Cavaco é uma das maiores rábulas de campanha. Lembro-me de uma professora numa universidade privada, que frequentei só por um ano, fazer a mais escandalosa apologia do senhor de botas cardadas e depois dizer com toda a candura que era dirigente de uma organização de trabalhadores democrata-cristãos. Há coisas que não jogam umas com as outras. Mas não vejam nisto qualquer espécie de teimosia: no dia em que Carvalho da Silva apoiar Cavaco, o meu voto vem logo a seguir ao dele. Atreve-te, moço...
terça-feira, novembro 29, 2005
Aviso à navegação
Soaristas, amigos, eu percebo que é preciso fazer passar a ideia de que Manuel Alegre é uma curiosidade política se se quer que Soares tenha algumas hipóteses de passar à segunda volta. Mas, convenhamos, as sondagens têm sido implacáveis e vamos a caminho de Dezembro. Alegre pode ser um candidato pouco consistente mas também não é um populista medonho. Por outro lado, a sua popularidade é o melhor barómetro do actual prestígio do sistema político. E nem foi preciso que entrasse em grandes tiradas demagógicas. Nas actuais circunstâncias, ridicularizar a candidatura de Manuel Alegre pode ser um beco sem saída para a esquerda, já para não dizer o óbvio: o verdadeiro adversário está do outro lado. Não alimentem o sapo porque ele depois pode ser demasiado gordo para engolir.
Eles vivem
A direita populista tem andado adormecida. Pela força das circunstâncias, Paulo Portas e Pedro Santana Lopes saíram de cena. Telmo Correia perdeu o congresso do PP. Nobre Guedes vai ter com que se entreter para os próximos tempos. A previsível chegada à presidência de Cavaco abre-lhes, porém, uma janela. Conscientes de que, a partir de Belém, Cavaco só pode desiludir a direita mais presidencialista ao mesmo tempo que vai transformar o PSD no seu quintal presidencial, os populistas preparam toda uma reconfiguração do lado direito do espectro político. O patético artigo de Santana Lopes ao Expresso é um sinal, a que se junta um outro na mesma edição do semanário de um seu ex-adjunto, Ricardo Alves Gomes, que prepara a vingança do PPD sobre o PSD e a união com o PP à revelia do CDS de Ribeiro e Castro. Os últimos meses de higiene democrática não devem fazer esquecer a política da trapalhada. E se tudo ruir – o governo Sócrates e a presidência «dinâmica» de Cavaco Silva -, cá estarão eles, com uma patine de falsa modernidade, para rapidamente apanharem os cacos.
sábado, novembro 26, 2005
Imprensa sensacionalista 1
António Guterres está no Paquistão com... cof, cof... Angelina Jolie. Calma, o Brad também foi.
Imprensa sensacionalista 2
A Sábado oferece esta semana «Cavaco na intimidade». Mas será mesmo necessário?
quinta-feira, novembro 24, 2005
Portuguesas e portugueses
Muito se tem dito que, mais do que nunca, é essencial que o próximo PR perceba de economia. Não sei, realmente não sei, mas percebo-os. Assim como assim, depois de 10 anos de Jorge Sampaio, a malta já só pede que o próximo PR perceba de qualquer coisa. Não é? Bom, é de tal maneira que alguns há que até vão votar Cavaco por causa disso.
terça-feira, novembro 22, 2005
Verso e reverso
Adriana Varejão no CCB
Do Manifesto Antropófago, à carne tagarela do herói Macunaíma, de Mário de Andrade, passando pelos índios canibais de Portinari ou pelos matadouros de Miguel Rio Branco, a carne é uma presença insinuante na cultura brasileira.
Adriana Varejão, de quem já se viu uma mais pequena exposição em Lisboa (Museu da Cidade, 1998), é um dos mais interessantes exemplos recentes desta sensibilidade marcada em partes iguais pela violência da colonização, pelo esplendor teatral do barroco ou por uma mítica visão de um Brasil índio originário que não cessa de se auto-dissecar.
Brasileiríssima na vivência dessas ambiguidades, mas cosmopolita e contemporânea no espectro das suas referências, Adriana Varejão pratica uma arte, simultaneamente, antropológica e teatral que tenta, ao mesmo tempo, olhar o todo e dar-se à proximidade da pele.
No seu trabalho, difícil de classificar disciplinarmente, a carne, o sangue e sobretudo a pele enquanto lugar que une ou divide interior e exterior, revelado e oculto, ganham com frequência uma condição metafórica ou transformam-se em imagem forte de uma cultura que traz a violência e o sacrifício inscritos na matriz.
Talvez por isso, o seu horizonte estético seja o de uma beleza sanguínea, capaz de sobrepor erotismo, sublime e morte que, em vez de se apresentarem como elementos contraditórios, se tornam interdependentes.
Logo no título - «Câmara de Ecos» - a exposição produzida pela Fundação Cartier e pelo CCB, que chega a Lisboa algo transformada, mostra as várias encarnações (e a palavra aqui é rigorosa) desse jogo de ressonâncias.
Estão lá algumas das pinturas inspiradas nas figuras de convite que fazem conviver a estética do barroco português com o canibalismo e as violências suas contemporâneas, mas também um gigantesco painel («Celacanto provoca maremoto», 2004) de igual aparência azulejar onde certos elementos surgem mal colocados como se o lastro histórico e iconográfico que eles transportam se transformasse numa abstracção ilegível ou reformulada de acordo com uma mundividência que já não entende os seus códigos originais. Entre as obras que revelam outras facetas do trabalho de VareVarejão encontram-se as «Saunas», pinturas a óleo de grande dimensão e pequenos desenhos a lápis que mimam o interior vazio desses espaços forrados pelos contemporâneos azulejos industriais. Varejão recupera a banalidade destes lugares funcionais para estabelecer verdadeiros teatros de luz, erguidos sobre jogos de perspectiva, quase fotográficos. Na verdade, é o mesmo inquérito aos espaços e imagens que vimos anteriormente projectados sobre o tempo da colonização, tentando ler na arquitectura (aqui são quase casulos) uma sensibilidade menos evidente da arquitectura contemporânea. Noutras obras, Varejão faz propositadas referências à arte internacional e a uma evidente afinidade electiva. As pinturas da série «Parede com incisões à la Fontana», de 2002, lembram as incisões sobre a tela do artista italiano, mas são deslocadas da abstracção para o campo dos objectos reais como cortes numa parede carnívora. Essa atracção por um real teatralizável, redobra em ênfase nas obras mais evidentemente escultóricas. «Linda do Rosário» e «Linda da lapa», ambas de 2004, transportam rumores de histórias (como quase sempre acontece com Varejão), nestes casos, o desabamento de um bordel numa favela onde um casal fazia amor, ou o padrão dos azulejos de um famoso restaurante carioca. Essas inscrições no tecido urbano trazem igualmente a ideia de escultura da pura especulação formal para um registo repleto de ecos vivenciais ou de acumulações de relatos e narrativas ainda que seja através da forma e da mistura conflitual dos seus elementos que estas se nos revelam. Esse processo salva-a da retórica e de um culturalismo ostensivo. A experiência da identidade é antes aqui, a experiência cumulativa da vida e da história.
No jogo permanente entre interior e exterior, entre o verso e o reverso do corpo, da história, da linguagem e dos símbolos, a arte de Varejão transforma-se assim numa plataforma de coisas lactentes onde os contrários se debatem e acasalam permanentemente. Em todos os casos, temos sempre o barroco, não como época historicamente delimitada, mas como sensibilidade estética duradoura - tão presente em Aleijadinho como em Cronenberg - a partir da qual procede a uma intensificação fantástica do real. Celso Martins, in Expresso.
A longa marcha para a independência
«Há dez anos senti que depois de o meu partido ter perdido as eleições, tinha a obrigação moral de me candidatar». Cavaco Silva, entrevista ao Público.
segunda-feira, novembro 21, 2005
Não te incomodes que não se nota nada
"Estou tão emocionado que não encontro palavras para explicar" - Cavaco Silva numa sala repleta de emigrantes portugueses no Brasil.
Não diga lá Excelência
O muito respeitosozinho programinha do Público e da Renascença, diga lá Excelência, poderá alguma vez ter Cavaco Silva como convidado?
Precisamente por isso
Tratando-me eu de um ultramoderado, confesso que andava a pôr-me dúvidas sobre se o Prof. Cavaco Silva, em caso de vitória, seria de facto tão mau PR como o pintamos. Cá seguia então amargurado, mergulhado em crises angustiadas sobre uma questão que, à minha volta, parece ser consensual - a saber: Cavaco Silva daria um desastroso PR. Assim sendo não poderia deixar de assistir à entrevista que deu a Constança Cunha e Sá. Querem saber que mais? Foi remédio santo. Uma prestação penosa, tortuosa, inconsistente, e de tão esquiva a momentos surreal. Foi há 6 dias e as ondas de choque só não foram maiores porque o candidato fugiu imediatamente a seguir para o Brasil. A mim, felizmente, fez-me bem, isto embora Cavaco não tenha respondido verdadeiramente a nada... e daí, se calhar, precisamente por isso.
domingo, novembro 20, 2005
Quiet heart
Ter um dia de decidir se gosto mais de McLennan ou de Forster... ora aqui está alguma da matéria de que se fazem os pesadelos, a insónia.
Para a escolha... I'd have to see straight and that would make me unkind.
quinta-feira, novembro 17, 2005
Sign o' the times
Sabendo que teria de esperar 7 semanas para que a loja entregasse os seus canapés preferidos, que "jogavam tão bem na sala com os tapetes que havia para entrega imediata", W. escolheu a saída mais fácil: o suicídio.
quarta-feira, novembro 16, 2005
Um problema na fala
Depois de um presidente que fala demais, os portugueses preparam-se para eleger um presidente que não diz coisa nenhuma. Será um problema com a fala ou a doença pendular?
segunda-feira, novembro 14, 2005
Lá nisso é poupadinho
«Eu só tenho uma palavra». Cavaco Silva em entrevista a Constança Cunha e Sá, TVI.
Um país de surdos
«Eu disse numa televisão que era contra uma intervenção [no Iraque] fora da égide das Nações Unidas». Ibidem
domingo, novembro 13, 2005
Marcha por marcha antes a outra
Saí de casa ao fim da tarde para tentar ver A Marcha Dos Pinguins. Com os problemas do trânsito, cortes de estrada, sentidos invertidos e mais a chuva, as coisas acabaram por não correr nada bem. Marcha ainda vi, pinguins chapéu!
sábado, novembro 12, 2005
É... é qualquer coisa... gigante e assim... e... e azul...
Cavaco falou e disse "Quero um Portugal que não tenha medo da globalização!". Assevero-vos que não contava ouvi-lo dissertar tão exaustivamente sobre um assunto, mas folgo em saber que estava bem acompanhado nesta desesperança, pois se até os próprios apoiantes exultaram. Quanto ao futuro, caro leitor, as instruções são as seguintes: procurar uma "coisa gigantesca e azul" e olhar bem para ela. Pois...
sexta-feira, novembro 11, 2005
Respectivamente, portanto
A meio da leitura de Carpenter's Gothic, de William Gaddis, já é possível afirmar que o homem é provavelmente o 2º ou 3º maior escritor americano, morto, ainda em actividade nos anos 80. Isto atrás de 1 ou 2, respectivamente portanto.
The insider
O André Belo escreve-nos directamente de Paris, sobre os motins e outras coisas. E esperemos que não sejam só 15 dias ó André.
Mas já nem se pode sair à noite para comer uns amendoins?
«11 detidos em casas de alterne»
Título do DN online
Título do DN online
Candidato a «esfingir»
«Cavaco Silva remete para os portugueses avaliação das críticas de Mário Soares»
May contain nuts
Wallace e Gromit são duas adoráveis criaturas. Assim posto pouco resta para contar d' A Maldição do Coelhomem. As aventuras destes dois organismos de plasticina valem sempre uma vista de olhos, e mesmo que não sejam todas igualmente entusiasmantes, existem sempre alguns episódios que redimiriam quaisquer 80 minutos na sala escura. Desta vez é um barril de madeira servindo de indumentária a Wallace (salvo o erro) com a seguinte inscrição: may contain nuts. Fazê-lo num filme destes deve dar um grande gozo. A sequência inicial é também um prodígio. O pastiche do filme de terror, as tomadas de câmara tão frequentes no género, os clichés, tudo um enorme prazer que transborda da tela para o espectador. Arrisco mesmo a dizer: Nick Park, Steve Box, seus maganos, vocês têm o melhor emprego do mundo.
Saber da poda
Um bom domínio do tempo narrativo, uma bem urdida teia de flashbacks, um sólido grupo de actores, uma realização segura e um argumento conspirativo mas credível (ou não fosse ele baseado num romance de Le Carré). É assim O Fiel Jardineiro, de Fernando Meirelles. Bastante estimável, portanto. A colagem da estética Cidade de Deus com o ambiente frio centro-norte da Europa origina contrastes que se sentem na pele. A diferença de temperatura desses dois mundos torna-se palpável, materializando-se em muito mais que apenas isso, em muito mais que uma mera amplitude térmica. Meirelles apostou bem nessa mistura de estilos. E deixou marca. Pena que, não se quedando por aí, o próprio filme, por vezes, vá todo ele atrás da pureza algo ingénua da activista Tess (Rachel Weisz). São poucos momentos assim, é certo, mas os suficientes para tornar inconstante um filme que, livrando-se deles, seria um objecto tão pertinente naquilo que teria a dizer como coerente na forma como o diria. Conclusão: o fiel jardineiro até sabia da poda, acordou foi tarde. Fernando Meirelles, esse, ainda vai muito a tempo.
Apenas um «supônhamos»
A direita sente claramente que numa 2ª volta a vitória de Cavaco Silva estará comprometida. Isso inquieta-os. Afinal de contas estas presidenciais foram ensaiadas, pelo menos durante 2 anos, como um passeio de Cavaco. Por isso o apelo ao voto esquerdista, seja em que candidato for, é vital.
Faça-se um pequeno exercício de futurologia. Imagine-se que Cavaco é eleito PR em Janeiro de 2006. Exercerá portanto o cargo até início de 2011. Para não mencionar o desejo revanchista da sua entourage, pense-se pelo menos no seguinte: no princípio de 2009 haverá eleições legislativas. Depois de 4 anos de poder, dificultados por uma presidência que, já o assumiu, actuará com forte cunho executivo, é bem possível que o PS as perca. Eventualmente, uma reedição da coligação PSD/PP assumirá de novo o poder. Nessa altura, com Cavaco Silva em Belém, imagine-se o que seria. Se nos 4 anos de Durão/Portas/Leite/Félix/Santana o ataque à classe média foi o que foi, imagine-se essa dúzia e meia de meses. Não são maniqueísmos. É apenas um «supônhamos».
quinta-feira, novembro 10, 2005
A pitonisa
«Lá para o fim do ano já ninguém pode ver este governo à frente, e a agitação política e social deverá estar no seu pico de fúria e revolta». Luis Delgado, in DN de ontem.
As pitonisas eficientes são as que são capazes de substituir, rapidamente, mil retomas floridas por outras tantas catástrofes oportunas.
Trabalho de casa
A triste história da perseguição descriminatória a um casal de adolescentes lésbicas na Escola Secundária António Sérgio em Gaia vem mostrar duas coisas: é urgente a educação sexual nas escolas portuguesas; é prioritário que ela seja primeiro ministrada ao corpo docente.
quarta-feira, novembro 09, 2005
terça-feira, novembro 08, 2005
The Lizard-King
Pela ouvidela rápida dificilmente escapará à lista de melhores do ano. Mas como isso importa tanto como lixo, melhor será dizer que, pela escutadela fugidia, este será álbum para voltar a colocar Oldham (aqui vestindo a fatiota Prince Billy) lá bem no alto, onde poucos chegaram e onde muito menos se mantêm. Desde logo uma alegre notícia para aqueles que acreditam que os álbuns ao vivo deveriam ser uma reeinvenção do material de estúdio: este é-o completamente. Depois, talvez melhor ainda, imagine-se o reportório de Oldham, proveniente das suas diversas encarnações - Palace, com ou sem Brothers, Oldham ou Prince Billy - esmagado por um poderoso rolo compressor que o deixa como se acabadinho de ver a luz do dia há cerca de 30 anos, que o mesmo é dizer, confere-lhe uma roupagem de rock setentista com tudo o que isso tem de bom, de muito bom e de excelente. Só que a coisa não se fica por aqui, pois o som dos Doors de LA Woman (ou outro qualquer dos melhores), dos Crazy Horse e Neil Young ou dos Velvet de Loaded é por sua vez mastigado pela trituradora de Oldham (várias guitarras, baixo, bateria, teclas e ainda coros femininos), que usa essa massa para revestir depois as canções de uma aridez cortante. Isso mesmo, esta música abrasiva corta como poucas hoje em dia. Se em Viva Last Blues os Palace já a tinham ensaido, aqui levam a experiência um passo mais adiante e saem-se muitíssimo bem, e o seu country-rock de agudas e serradas arestas não se ressente minimamente pela invocação de referências de cariz mais urbano, chamemos-lhe assim, para a sua paisagem sonora de seca extrema. Assim de repente... um disco que cospe directamente do turbilhão folk-rock da década de 70 um epíteto que Oldham pode, mais que ninguém hoje ou ontem, pendurar ao pescoço, dizendo: eu sou o rei-lagarto, eu posso fazer o que bem entender. Os últimos 10 anos têm-no provado.
Kentridge no Chiado
«Animar é dar vida. Esta é uma chave possível no diálogo com as animações mostradas pelo artista sul-africano William Kentridge (Joanesburgo, 1955) no Museu do Chiado e para nos abeirarmos do tributo que nelas presta ao pioneiro do cinema Georges Méliès, que no final do século XIX transportou a Sétima Arte da intenção documental para o campo da efabulação e do fantástico. (...) No seu caso, a animação não é tanto uma adequação à expectativa de movimento da imagem do espectador contemporâneo mas um produto de condensação do próprio processo de trabalho onde o desenho, sempre em estado de transfiguração detém um papel crucial. (...)Conhecido internacionalmente a partir dos anos 90 pelos seus filmes feitos com desenhos a carvão e pastel, onde o humor e a angústia se misturam, Kentridge apresenta em Lisboa um conjunto de trabalhos em que o nível de abstracção se adensa e a performance ganha terreno. (...) Mas é ainda um mundo misterioso onde o erotismo, o humor e o sonho se oferecem em múltiplas efabulações.»
excertos de «Ao Vivo no estúdio», Celso Martins, in Expresso, 15.10.05
Zack la Rogue
Zack Rogue é nome de rapaz que anda descaroçando orelhas de melómanos no mundo pop/rock lo-fi de guitarra. Em cerca de um ano a Sub Pop mandou cá para fora dois discos da banda do moço, os Rogue Wave, e os resultados, diga-se, sem arrebatar agradam. Não havendo propriamente razão para fazer o coração ribombar a 800 bpm (batidas por minuto), o facto é que a música é inspirada. É certo que a cada 90 segundos lembramo-nos de alguém que há 2, há 20, ou há 40 anos fez algo parecido, mas, escutada a cançãozinha, não enjoa, bate-se o pezinho e fica na cabeça. E quando assim é, venham os tremocitos e a bejeca que às vezes também não apetece ir mais longe. É que vamos lá ver, um gajo não pode ouvir Dylan, Eitzel, Edwards, Berman ou Oldham todos os dias. O coração não aguenta... a cabeça também não.
sábado, novembro 05, 2005
Aurora
Ao contrário do que tem sido veiculado por alguns cinéfilos, é perfeitamente possível amar cinema e não ser particularmente entusiasta desta obra de Murnau. A esta distância de praticamente 80 anos, o que ela nos pede de pureza no olhar é quase sobrenatural, e se alguns a concedem de bom grado, pela beleza que no todo a empreitada encerra, outros nem por isso. E não virá daí grande mal ao mundo, nem a Murnau. Quanto muito, apenas aos próprios. Mas não se preocupem com isso.
Nisso?
Li há pouco o texto (Pensem nisto) em que o historiador Rui Ramos vem dizer o que espera de Cavaco na presidência da república. Conclusão: ou os governos deste país seguem a cartilha cavaquista ou devem ser destituídos. Para sustentar esta ideia de controlo musculado da acção governativa, o texto envereda ainda por quatro ou cinco linhas fortes, mas confesso que, de Rui Ramos, esperava bem melhor.
Desde logo a questão de os governos hipotecarem o futuro, ou a tentativa de “salvar o ‘statu quo’ à custa do futuro”. Como todos sabemos, entre 1985 e 1995, no consulado de Cavaco, o controlo do défice era implacável. Não, não é ironia, falo a sério, só que ao contrário: mal o “monstro” descia da casa dos dois algarismos percentuais, accionava-se imediatamente o plano nacional de emergência e, à falta de ideia melhor, enterravam-se algures uns milhões de contos em betão. Estranha forma de não hipotecar o futuro.
Do sebastianismo. Havendo cinco candidatos, não parece estranho a Rui Ramos que se fale de sebastianismo apenas em relação a um deles, curiosamente aquele que na verdade andou dez anos desaparecido e agora pretende ser Presidente da República? Vejamos, também acho que por cá se refere o sebastianismo por dá cá aquela palha, mas a candidatura de Cavaco não é certamente o exemplo mais estapafúrdio para o invocar.
Seguidamente o argumento de que tanto Alegre como Soares agora imitam Cavaco. Um, “de repente, também quer ser independente dos partidos”, e o outro “finalmente compreende, depois de muitos anos, que sem criação de riqueza o Estado Social não sobreviverá”. Não se desse o facto de a candidatura do primeiro ser de facto independente do PS, enquanto a de Cavaco Silva não o é efectivamente do PSD, e de o estado do Estado Social português ter muito a ver com os dez anos de governo do professor, e talvez a ideia funcionasse. Assim é gincana argumentativa.
Pelo meio fica também um estranho entendimento do tempo, que põe no mesmo plano “os choques do dr. Barroso e do eng. Sócrates”, isto é, equipara dois anos e meio de governo Barroso (quase quatro anos de PSD/PP, no total) a pouco mais de seis meses de governação Sócrates. Deve ser porque dá jeito.
Diz ainda que em política, hoje, “quem quiser ser levado a sério tem de ser um pouco ‘cavaquista’”. Eventualmente até será verdade, só que a sê-lo é por aquilo que efectivamente Rui Ramos não escreve, isto é, que dez anos de desaparecimento dão para conferir um certo ar de neutralidade a qualquer acto de ressurgimento, sobretudo pelo não comprometimento com nada nem com ninguém durante esse período. Até vou mais longe: nesse sentido é fácil ser Cavaco Silva. Mais difícil seria ser Presidente da República.
Desde logo a questão de os governos hipotecarem o futuro, ou a tentativa de “salvar o ‘statu quo’ à custa do futuro”. Como todos sabemos, entre 1985 e 1995, no consulado de Cavaco, o controlo do défice era implacável. Não, não é ironia, falo a sério, só que ao contrário: mal o “monstro” descia da casa dos dois algarismos percentuais, accionava-se imediatamente o plano nacional de emergência e, à falta de ideia melhor, enterravam-se algures uns milhões de contos em betão. Estranha forma de não hipotecar o futuro.
Do sebastianismo. Havendo cinco candidatos, não parece estranho a Rui Ramos que se fale de sebastianismo apenas em relação a um deles, curiosamente aquele que na verdade andou dez anos desaparecido e agora pretende ser Presidente da República? Vejamos, também acho que por cá se refere o sebastianismo por dá cá aquela palha, mas a candidatura de Cavaco não é certamente o exemplo mais estapafúrdio para o invocar.
Seguidamente o argumento de que tanto Alegre como Soares agora imitam Cavaco. Um, “de repente, também quer ser independente dos partidos”, e o outro “finalmente compreende, depois de muitos anos, que sem criação de riqueza o Estado Social não sobreviverá”. Não se desse o facto de a candidatura do primeiro ser de facto independente do PS, enquanto a de Cavaco Silva não o é efectivamente do PSD, e de o estado do Estado Social português ter muito a ver com os dez anos de governo do professor, e talvez a ideia funcionasse. Assim é gincana argumentativa.
Pelo meio fica também um estranho entendimento do tempo, que põe no mesmo plano “os choques do dr. Barroso e do eng. Sócrates”, isto é, equipara dois anos e meio de governo Barroso (quase quatro anos de PSD/PP, no total) a pouco mais de seis meses de governação Sócrates. Deve ser porque dá jeito.
Diz ainda que em política, hoje, “quem quiser ser levado a sério tem de ser um pouco ‘cavaquista’”. Eventualmente até será verdade, só que a sê-lo é por aquilo que efectivamente Rui Ramos não escreve, isto é, que dez anos de desaparecimento dão para conferir um certo ar de neutralidade a qualquer acto de ressurgimento, sobretudo pelo não comprometimento com nada nem com ninguém durante esse período. Até vou mais longe: nesse sentido é fácil ser Cavaco Silva. Mais difícil seria ser Presidente da República.
sexta-feira, novembro 04, 2005
O mundo simples de José Manuel Fernandes
É um mimo de sociologia de esplanada a visão do director do Público sobre os bairros problemáticos dos arredores de Paris que estão na origem dos motins dos últimos dias: «Os que fizeram pela vida partiram e vivem em habitações que correspondem às suas ambições sociais. Outros não o fizeram. Ficaram para trás, queixando-se, desistindo, aceitando a marginalidade e convivendo com ela.» Simples, não é? Quem quer, enriquece; quem não quer acomoda-se. Os preguiçosos merecem o pouco que têm e os audazes são sempre recompensados. Ao menos Sarkozy foi directo, chamou-lhes escumalha.
Um Rio demasiado turvo
Depois de uma manchete menos simpática do Jornal de Notícias, Rui Rio resolveu entrar em «blackout» parcial. Só aceita entrevistas por escrito, ou seja, não aceita contraditório, como só se passa nas ditaduras. Este tipo de coisas acontece em Portugal quando os políticos, investidos de uma forte legitimidade eleitoral, se esquecem que o jogo democrático não acaba aí, como se tivessem todos os trunfos na manga. Alberto João Jardim anda a explicar-nos este processo há anos. Aos jornalistas sobram duas opções: ou entram no jogo e amocham ou fazem um bocadinho de pedagogia democrática e a solução é só uma: boicote.
quinta-feira, novembro 03, 2005
O medo ao contrário
À direita, e ontem Constança Cunha e Sá, entrevistando Soares, insistiu nessa tecla, diz-se que a esquerda tem medo de Cavaco. Para dar consistência ao mito fala-se do número de candidaturas à esquerda, quatro, todas contra o professor de economia. Trata-se, claro, de uma baboseira, desde logo visando esconder a realidade inversa. Na verdade, o eleitorado de esquerda pode rever-se nas suas múltiplas tendências nos vários candidatos. Já a direita esconde-se inteirinha atrás de um homem apenas, que, sabemo-lo, não corporiza todas as inclinações do sector ideológico a que está efectivamente a dar voz. Isto sim é medo. Não o contrário.
O coaching de Alegre
Jesualdo Ferreira e Manuel José apoiam Manuel Alegre
A táctica do quadrado será com certeza bem ensaiada.
A táctica do quadrado será com certeza bem ensaiada.